domingo, 16 de dezembro de 2012

REFORMA DA SEGURANÇA SOCIAL: PASSOS COELHO NÃO SABE DO QUE FALA. MAIS ESTUDO É O QUE SE RECOMENDA. MENOS POPULISMO TAMBÉM É DESEJÁVEL NESTE PERÍODO DIFÍCIL PARA OS PORTUGUESES.


A generalidade dos sistemas públicos de segurança social, tal como os conhecemos hoje, pretende desempenhar duas funções principais: 
(i) uma função de seguro, face às oscilações imprevistas no rendimento e face à incerteza quanto ao tempo de vida depois da reforma; e 
(ii) uma função de redistribuição
Esta coexistência de objectivos num mesmo sistema não é, no entanto, pacífica.

A crescente tomada de consciência dos problemas estruturais que afectam os sistemas públicos de segurança social em regime de repartição contemporânea tem contribuído para aumentar a contestação a esta mistura de objectivos no mesmo sistema ou, pelo menos, num mesmo pilar do sistema. É possível encontrar vários argumentos dentro desta linha de pensamento.
Em primeiro lugar, argumenta-se, não faz sentido redistribuir a favor dos idosos como um grupo, uma vez que estes constituem mesmo a geração mais favorecida (por exemplo, no caso dos Estados Unidos). Faria sentido, assim, que a redistribuição de rendimento a favor dos idosos estivesse integrada num mecanismo geral de combate à pobreza.

Em segundo lugar, e no seguimento do argumento anterior, há quem entenda que a redistribuição de rendimento deve ser um objectivo e (como tal) um encargo de toda a sociedade e não apenas daqueles que, por receberem uma remuneração pelo seu trabalho, contribuem para o sistema de segurança social. Assim, deveria haver uma diversificação das fontes de redistribuição ou, em alternativa, esta deveria ser exclusivamente sustentada por receitas gerais do Estado.

Em terceiro lugar, e acima de tudo, argumenta-se também que a mistura de objectivos dentro do mesmo sistema tem prejudicado, quer a eficácia da redistribuição do rendimento, quer a própria solvabilidade da segurança social como mecanismo de repartição contemporânea.

Na origem dos problemas da segurança social está o facto de as suas regras terem sido concebidas num contexto económico e demográfico bastante diferente do actual. 
Baseando-se num esquema de repartição contemporânea (ou pay-as-you-go), sem um stock de poupanças (relevante) para cobrir as obrigações futuras, assente num número de activos suficiente para cada reformado, a satisfação das responsabilidades do Estado para com as sucessivas gerações de trabalhadores está dependente (num sistema pay-as-you-go puro) do crescimento suficiente da massa salarial, sob a qual incidem as contribuições e a manutenção constante da natalidade do país.

Porém, no caso português, os salários reais têm vindo a crescer cada vez menos ao longo dos últimos trinta anos e a natalidade cai abruptamente nos últimos 15 anos. Pelo que, em resultado da evolução das taxas de fertilidade e mortalidade, existem cada vez menos trabalhadores activos para sustentar as pensões dos reformados. 
Em suma, o crescimento da base contributiva do sistema de repartição já não é suficiente para acompanhar o crescimento das responsabilidades do Estado no pagamento de pensões, prevendo-se que, em Portugal, no caso de nada ser feito para reformar o sistema, as contribuições dos trabalhadores activos deixem de ser suficientes para financiar as pensões algures entre 2016 e 2020 (Vejam Comissão do Livro Branco da Segurança Social (CLBSS), 1998).

Nos últimos anos, têm vindo a ser introduzidos no sistema português de segurança social alguns ajustamentos, sem que se tenham alterado as suas regras essenciais. Exemplos destas medidas são o prolongamento da idade de reforma (no caso das mulheres), o aumento da taxa contributiva, a reformulação das regras de cálculo das pensões no sentido da diminuição do seu valor e, por último, a criação ou aumento de outros impostos com a afectação de receitas à segurança social (como é o caso do chamado “IVA social”).

Uma característica importante de um sistema de segurança social do tipo pay-as-you-go é a possibilidade de ser utilizado com fins redistributivos, tanto dentro de uma geração como entre diferentes gerações. Ao contrário do que acontece num sistema de capitalização, não existe uma ligação actuarial entre as contribuições pagas e os benefícios recebidos. As contribuições podem assim ser utilizadas, em parte, para financiar as prestações de outros beneficiários que se encontram em situação de carência. Esta possibilidade traduz-se na redistribuição intratemporal atrás mencionada, encontrando-se exemplos na garantia de uma pensão mínima, na existência de um regime não contributivo ou na diferenciação da actualização anual das pensões.

O tipo de ajustamentos atrás referidos implica um retorno cada vez menor das contribuições para as novas gerações de pensionistas. Fala-se, neste caso, de efeitos redistributivos intergeracionais. O aumento das contribuições, por exemplo, beneficia a população reformada ou os trabalhadores activos de idade mais avançada, em prejuízo dos trabalhadores activos mais jovens, violando-se gravemente o princípio da solidariedade intergeracional, já que estamos a obrigá-los a pagar agora para os actuais pensionistas receberem, mas não se garante que quando chegar a sua altura eles possam beneficiar na mesma medida.

É, pois, hipócrita, Passos Coelho, e ignorante, quanto trata esta questão séria da sustentabilidade da segurança social na lógica populista e alimentadora de ódios e invejas (tal como Sócrates o fez em momentos concretos da sua governação) entre portugueses.
Quem tem, hoje, as pensões mais elevadas, tem-nas em resultado das remunerações e anos de trabalho prestado, com base na lei vigente à época, feita, preparada e aprovada pelos senhores políticos (onde se inclui Passos Coelho que na década de 90 era deputado, tendo o actual sistema de segurança social tipo pay-as-you-go sido criado com Cavaco Silva, nesse período).

Portanto, o problema da sustentabilidade volta a colocar-se hoje, tendo os portugueses de optar manter o sistema pay-as-you-go ou passar a um sistema de capitalização.
Se os portugueses quiserem um sistema pay-as-you-go terão de ser tomadas medidas claras de incentivo à natalidade, sabendo que o seu impacto real só será visível dentro de 20 anos.
Se se optar mudar de sistema e escolher o sistema de capitalização, os portugueses terão de se convencer de que terão de pagar parte da sua reforma futura, mantendo, provavelmente, os mesmos índices de descontos para a segurança social.

Qualquer que seja a escolha, importa deixar as seguintes reflexões:

  1. Concordo com a introdução do princípio da progressividade dos descontos para a segurança social, em vez da proporcionalidade (hoje em dia todos descontam a mesma percentagem sobre o seu rendimento bruto, sendo também evidente que quem mais ganha mais paga, já que a percentagem incidente sobre a sua remuneração é superior às remunerações mais baixas), o que implica que quem mais ganha passa a ter taxas de desconto para a segurança social maiores, introduzindo-se o princípio da solidariedade entre classes sociais.
  2. Porém, essa progressividade não deverá ser significativa, sob pena de se desincentizar os quadros superiores e os mais qualificados a irem embora, pois tal implicará menor salário líquido mensal inferior, e também poderá contribuir para que menos quadros superiores e mais qualificados queiram ficar em Portugal na sua reforma, já que descontarão mais para receber menos.
Ou seja, um sistema destes incentivará as novas populações activas a não quererem apostar em Portugal e Portugal precisa dos mais qualificados para se reconstruir e desenvolver, resta ao país perceber se quer arriscar.

(EXCEPCIONO, NATURALMENTE, AQUELES QUE, AO CONTRÁRIO DA MAIORIA DOS PORTUGUESES, APENAS DESCONTAREM 8 ANOS (E MUITAS VEZES SEM QUALIFICAÇÕES) PASSANDO A TER PENSÕES VITALÍCIAS QUE DEVERIAM FAZER CORAR DE VERGONHA POLÍTICOS E GESTORES PÚBLICOS DE NOMEAÇÃO POLÍTICA. ESSES FALSOS MORALISTAS FORAM, PORÉM, INCAPAZES DE PRESCINDIR DESSE DIREITO ESCABROSO. ESTÃO, HOJE, CALADOS  À BEIRA DA LAREIRA).

2 comentários:

  1. Limpar a casa, terminando com situações abusivas como seja somar várias pensões , juntar pensões com salários .Impedir que os funcionários públicos acumulem com a privada, ganhando dois salários ( as mais das vezes em situações pouco transparentes)

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  2. Luis concordo com tudo o que disse.
    Porém, se introduzir um regime de absoluta exclusividade para funcionários públicos tem de lhes pagar mais. Recordo-lhe que os da privada podem ter 3,4 ou mais empregos sem sequer terem de pedir autorização a cada patrão.
    Não pode criar um regime da função pública tão miserável e pobre que ninguém qualificado para lá quer ir. E isso, Luis, é característica dos países de terceiro mundo.
    Uma Adm Pública medíocre será fatal para as empresas.

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